Comumente as pessoas que se aproximam me perguntam se sou feliz, sobretudo se não têm afinidades com a Igreja, me indagam como posso ser feliz sendo religioso e digo-lhes que sou, porque descobri a alegria de servir à Igreja missionária como Oblato de Maria Imaculada. Acredito que no coração de todo ser humano há uma busca profunda pelo sentido de ser e existir, que o atrai para algo mais, onde se encontra Deus, é ele o desejado e “desejante” que impulsiona a viver Com, Por e Nele.
A minha busca passou e passa pelas perguntas e inquietudes dos primeiros jovens apóstolos e das juventudes atuais: “Mestre onde moras? (Jo 1, 38-39). Esta é a pergunta que me inquietou a dar respostas à vocação ou seja ao chamado de Deus para minha vida. No dia seguinte, João aí estava de novo, com dois discípulos. Vendo Jesus que ia passando, apontou: “Eis aí o Cordeiro de Deus”.
Perguntando onde Jesus morava, precisei que alguém me apontasse com o seu testemunho de vida quem era Ele, de minha família recebi a fé, de meus padrinhos a participação na vida eclesial, das Religiosas Missionárias de Nossa Senhora das Dores em sua missão inserida e de Padre Ricardo meu pároco naquela época o despertar para missão na catequese, nos grupos de reflexão, no MAC movimento de adolescentes e crianças, na vivacidade das Comunidades Eclesiais de Base, na Pastoral da Juventude, nos leigos missionários e no engaja-mento social, muitas romarias, encontros, caminhadas, gritos dos excluídos tudo dinamizado também por leigos comprometidos, que tinham ardor em anunciar Jesus Cristo e seu Reinado denunciando toda estrutura de morte e opressão.
Ainda ecoa em minha mente o singelo e comprometedor: “Eu sou feliz é na comunidade...” Cantando testemunhei os mutirões para construir o centro comunitário, as escolas comunitárias, associações de agricultores, mulheres, cortadores de pedras e tantos outros organismos em prol da vida. Que bons tempos da Igreja Povo de Deus! Da fé e ação, do sonho e das lutas, da fraternidade, dos grandes investimentos na formação de lideranças, do cuidado das pessoas, das rebeldias juvenis, santos e santas missionárias (os) que nos suportaram, acreditando em nós. Tempo de infância e adolescência fui aos poucos compreendendo que tudo que era feito para indicar: “Eis o Cordeiro...”... “Ouvindo essas palavras, os dois discípulos seguiram a Jesus...”.
Neste ambiente missionário, senti-me atraído, interpelado para seguir mais de perto aquele há quem tanto me apontaram, queria viver semelhante àquele Padre e aquelas religiosas que cruzaram fronteiras para anunciar o reino de Deus. No processo de discernimento compreendi a presença do Senhor que outrora me perguntava: “o que é que você está procurando?”. Buscava compreender a inquietude de um chamado que me realizasse como pessoa e cristão. Estava no início de minha juventude e queria trabalhar em algo que pudesse unir fé e serviço, descobri minha vocação para educador, ingressei na faculdade e mais tarde estava lecionando para jovens de 5ª à 8ª série, bons tempos, que me renderam boas amizades, colegas de profissão e a confiança de estudantes que descobriram que o conhecimento só é valioso se está a serviço da transformação social.
Dois anos mais e estava na secretaria municipal de cultura, junto com outros jovens. Ousamos nas políticas públicas a serviço do bem comum e quanto bem colhemos, apesar das adversidades enfrentadas, descobrimos que o serviço público será eficaz na medida em que pessoas comprometidas com o povo estejam atuando nele. Todas essas experiências me deixaram marcas de gratidão a muitos que confiaram e fizeram seus, os nossos sonhos. Valeram os riscos.
Apesar de gostar e ser feliz com o que fazia, faltava algo em mim, que os meus medos não me permitiram experimentar. Neste caminhar havia conhecido os Missionários OMI através do Padre Wilmar que me orientou no processo de discernimento, cada encontro meu coração se enchia de vida e de sentido, amadureci na minha paixão pela missão e pela congregação e anos de discernimentos me levaram a optar pelo seguimento a Jesus Cristo no jeito de Santo Eugênio. Eles disseram: “Rabi (Mestre), onde moras?” Jesus respondeu: “venham, e vocês verão”.
Ingressei na Casa de Missão em Recife no ano de 2006, movido pelo desejo de saber onde o mestre morava. Com o auxilio dos formadores Pes. Wilmar e Arlindo fui iniciado na Vida Religiosa Oblata, a Favela de Borborema pertencente à paróquia administrada então pelo Padre Cássio, o primeiro chão para ver onde o mestre havia passado e marcado a vida dos animadores, deparei-me com a dura realidade do tráfico, do abandono de crianças, adolescentes e dos jovens cooptados pelas drogas e o álcool, esquecidos pelo governo. A presença OMI era sinal de Esperança, encontrei corações incendiados pelas palavras de esperanças do Salvador. “Vim para que todos tenham vida” e muitos deram vida para o viver de outros.
Iniciativas de leigos comprometidos, quanta força e fé para enfrentar sistemas e esquemas de opressão, aprendi a escutar, a partilhar comida, saberes e a vida com os últimos renegados pela sociedade, mas amados pelo mestre. Com eles descobrir que ser OMI é doar-se a serviço dos pobres na dialética missionária de se dar e receber. Confesso que não vi o mestre, mas escutei, rezei, celebramos, e vi os frutos da presença Oblata.
A busca continuava, fui ao noviciado em Paraguai, quantos desafios a serem enfrentados! Novo idioma, distintas mentalidades e a dura realidade daquele país, longe da família, dos amigos faltava o aconchego do Brasil, mas trasbordava a graça de Deus através dos gestos de acolhida dos paraguaios, aprendi a ser feliz com os indígenas, sem-terras, e os agricultores, deparei-me com minhas fragilidades, com minha pequenez diante de tão grande missão, e a pergunta: porque o mestre me trouxe aqui? No sol, na chuva ou na lama, dormíamos quase que esgotados de dias intensos de caminhadas, sem TV, rádio ou outro meio de comunicação. Alentava-nos o silencio da natureza exuberante que fascinava e dava medo. Animados pelo povo que nos formavam com suas vidas e testemunhos, professei os primeiros votos com a consciência de que não nascemos OMI, mas nos tornamos graças à ajuda de Deus e do testemunho de outros Oblatos que deixam marcas indeléveis de vidas consagradas para serviço da Igreja entre os pobres.
Voltando ao Brasil, fiz o curso de teologia na certeza de que é preciso aprofundar a fé, iluminando-a com a razão e razão com a fé, para compreender como o mestre havia transformado tantos corações que se uniram pela missão. Em São Paulo a busca do mestre em uma metrópole com seus arranha-céus, na lama da Favela de Ilhas das Cobras, agora Comunidade São Francisco de Assis. Com o testemunho e a partilha de muitos Oblatos a construção da Capela, os mutirões para desativar e retirar o lixão, as redes de esgotos com a participação de todos, a legalização da água, da luz, e as liturgias que ecoavam em nossas vidas, atualizando do Evangelho.
Graças às provocações do meu formador Padre Francisco Rubeaux, fui desafiado a mergulhar, inserir-me na realidade para encontrar o mestre, não vi o mestre, mas escutei seu clamor que dizia: “vai, diz aos jovens que se levantem e andem” e descobri que ir ao encontro dos jovens para servi-los, é servir ao mestre. Mas afinal, onde está o mestre? Não o vi em revelação, mas posso afirmar que passou na vida de muitos e convida a dilatar o reino de paz, justiça e amor, muitas vezes sufocado por poderes diabólicos e sistemas de morte. Precisamos do seu Amor para perseverar, e é possível seguir juntos como irmãos na caminhada missionária dos OMI anunciando o Reino de Deus.
Celebrei recentemente, na Paróquia Santo Eugênio, que hoje me abriga para o desenvolvimento pastoral, com profunda alegria, meu Diaconato, disposto a servir progredindo em direção ao Sacerdócio, reconhecendo que semelhante a Maria aos pés da Cruz, desejo expressar solidariedade aos crucificados de hoje, que escolhi como lema e concluir reafirmando: Por tudo isso: Sim eu sou feliz!!! De minha parte continuarei a buscá-lo, agora na partilha com os nossos Irmãos do Sul da África. Rezem por mim, aceitando a provocação que Ele faz também à sua vida!
Diácono Edicarlos Alves da Conceição, OMI